9 anos, hoje.

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Eu adoro o dia de hoje. O dia primeiro de maio. Adoro ele!

E não é ~só~ porque é feriado não. Uh-hum. É porque é um dia especial, que me traz lembranças boas e me faz reviver bons momentos.

Não vou me esquecer jamais: há 9 anos, nesse mesmo dia, domingo à noite. No Bacacheri, na Casa da Vó Helena (desconheço o nome do terreiro, chamávamos assim. Era a casa da Vó Helena, um benzedeira braaaaava, tinha uns 108 anos, e interrompia as giras para reclamar do povo que deixava o carro estacionado na frente do portão da casa dela).

Pois bem, as giras aconteciam na casa da Vó Helena (anos depois tínhamos endereço próprio). Era (ainda é, na verdade) uma casa pequena, velha, nos fundos do terreno. Para entrar, você passava por um portãozinho de ferro (já aproveitava para pedir licença porque ali já tem mandinga). Passa por um corredor escuro e cheio de espada de São Jorge, Arruda e Guiné plantado no canteiro, ao lado esquerdo. E logo se depara com uma porta com a luz acesa. Ao lado esquerdo estão os bancos, no lado direito tem uma porta que dá para um oratório cheeeeeio de velas e fotos (lembra que a Vó Helena é benzedeira), e à frente, após a corrente, pessoas vestidas de branco, dentro de um espaço pequeno, com chão de taco de madeira, paredes carregadas de imagens de santo e um altar muito bonito e iluminado. No altar: imagem de N. Senhora Aparecida, um Jesus umbandista, um quadro do Jesus europeu bem simpático, e à direita os atabaques. Na esquerda tem outra porta, que dá para os fundos do terreno, onde os médiuns entram e saem para acessar o cruzeiro das almas ou o quartinho onde guardávamos nossas coisas pessoais. Ninguém acessava a tronqueira a não ser os dirigentes que possuiam permissão para tal.

Eu adoro essa recordação. Não sou apegada ao passado, mas gosto de me lembrar de lá, de como era a casa, como era estar lá. Da energia do lugar, das pessoas, das giras… É uma nostalgia boa, não me deixa triste, apenas com saudades.

Me lembro de como foi uma época ótima lá. Para mim, nem se fala. Era como uma criança descobrindo o mundo. Eu era tipo uma esponja: absorvia as informações, aprendia, observava e conhecia. Não tinha tantos dilemas na minha cabeça e meu sentimento era bem sólido: eu me sentia pertencente àquele lugar.

O primeiro dia foi interessante. O primeiro dia dentro da corrente, eu digo.

As giras eram aos domingos, e o atendimento começava às 18h. Logo, a gira de desenvolvimento começava às 16h. E o curso de magia divina às 14h. Era no Bacacheri, e eu morava no Campo Comprido, então eu tinha que sair de casa, no máximo às 13h (quando estava de carro) para chegar no horário cedo o bastante para conseguir estacionar próximo, me arrumar com calma e me posicionar em um lugar confortável para o curso. No primeiro dia era a gira de desenvolvimento. Me lembro de ter chegado cedo, mas de ter ido sozinha. Meus pais não puderam ir nesse dia, então, fui sozinha mesmo. Na gira de desenvolvimento, chamaram os Pretos Velhos, e na semana anterior, o dirigente havia nos avisado de levar alguns elementos pois haveria firmeza do anjo da guarda no dia 01 de maio, dia do trabalho (adoro o trocadilho). Eu nem sabia o que era firmeza do anjo da guarda, mas fui e levei minhas coisinhas: uma quartinha branca, uma vela branca de sete dias, um cristal e uma guia toda branca leitosa. Cantaram o hino da umbanda, os pontos de defumação e a abertura do trabalho. Então chamaram o Pai Benedito, logo arrumaram os banquinhos ao redor dele, onde eu e mais algumas pessoas nos sentamos. Outros Pretos Velhos vieram em terra incorporados em médiuns mais velhos. E eu senti a familiar dor na lombar (que eu costumava sentir sempre que ia à Missa). Também incorporaram alguns Erês, e eu me lembro de me sentir incomodada em ver adultos agindo de maneira infantil. O fato de eu não ser muito ligada à crianças me faz me sentir desconfortável em giras de Erês até hoje, apesar de adorar essa Linha.

Um a um se dirigia ao Pai Benedito para realizar a firmeza. Cantavam pontos. Eu me sentia eletrizada. Uma energia percorria meu corpo e eu sentia como se não fosse possível ficar parada. Quando chegou a minha vez, me lembro que foi breve. O Pai Benedito lavou minha guia na bacia com água e ervas, colocou no meu pescoço e elevou minha vela já acesa acima da minha cabeça e fez uma oração. Colocou parte da água dele na minha quartinha, lavou o cristal e colocou ali dentro.

Depois desse momento, me lembro de ter incorporado pela primeira vez. Não sei se dá para dizer que era uma incorporação, mas era uma vibração muito muito forte, nunca havia sentido nada igual. Meu corpo curvou-se e minhas mão chacoalhavam rápido demais. Eu me lembro de estar de olhos fechados e sentido tudo aquilo. Era uma manifestação? Uma incorporação? Quem era? Logo me sentaram em um banquinho e eu fiquei lá sentindo a vibração. Dentro de mim eu sabia o que estava acontecendo sim, mas era novo da mesma maneira.

E essa é a minha lembrança do primeiro de maio de 2011, meu primeiro dia como umbandista 🙂 Vieram outros momentos depois, muitos sendo muito bons, vários momentos de incertezas e dúvidas em relação a muita coisa. Bambeei na minha caminhada, cai em alguns momentos, mas me conheci melhor também. Confesso que nesse momento me sinto estranha, um pouco distante de quem eu era. Quando eu me lembro desses momentos, parece que não sou mais a mesma pessoa. A mesma pessoa na umbanda, sabe? Eu amo essa religião e sinto verdadeiramente que ela faz parte da minha vida mesmo. Não me vejo não sendo umbandista. Mas ainda sinto uma angústia, sabe? Parece que eu me distanciei tanto nos 3 anos em que fiquei fora de um terreiro, que parece que eu nunca mais vou vivenciar a umbanda da mesma forma. Isso me assusta, apesar de que provavelmente deva ser normal e útil na minha caminhada.

E eu gosto de registrar esses pensamentos por aqui também, é uma forma de manter a chama acesa, e de me voltar para quem eu sou de verdade, por debaixo dessa casca dura.

São 9 anos na umbanda, onde eu tenho certeza que, quanto mais eu aprendo, menos eu sei. 9 anos não é muito, não significa nada, mas ao mesmo tempo, é muito sim, muito pra mim quando eu olho para trás, pouco para mim quando eu fico diante de tantos mistérios. Posso dizer que já estou aprendendo a dar alguns passos na umbanda, e não apenas engatinhar? Espero que sim, rs. Continuo me sentindo criança, descobrindo um mundo novo a cada gira, ou a cada página do livro lida. Mas sabe quando a criança descobre que papai noel não existe? É essa criança que eu me sinto agora. E está tudo bem!

(senhor, como eu falo e disperso né?)

Por fim, para recordar um pouco do espaço como era lá, vou colocar aqui o vídeo gravado por uma irmã de corrente. É um documentário que ela filmou para a faculdade onde aparecem algumas pessoas importantes para mim, como meu Pai de Santo daquela época, minha irmã e querida sacerdotisa (e Mãe de Santo maravilhosa) e outras pessoas a quem guardo imenso carinho (a mensagem do vídeo é importante também):

O que ainda me liga a esse passado são algumas pessoas com quem mantive laços. Pessoas que eu amo e confio demais. Pessoas que eu sei, sinto dentro de mim, que um dia estaremos juntos novamente. Quando, onde e como, não temos certeza, mas é certo que esse laço não se desfez por acaso. 

 

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